Um fato comum que geralmente acontece nos salões de humor é empatia ou a antipatia em relação aos trabalhos premiados. Nos salões de humor que tenho oportunidade de ir, faço questão de ver cada trabalho e analisar cada um. Especialmente as caricaturas. Vou relatar um fato pitoresco que aconteceu por causa do Salão Carioca de Humor em 1996 , onde comecei a entender que o reconhecimento ao trabalho de um artista pode ser promovido de várias maneiras e não somente quando uma comissão julgadora determina. Fui à abertura do salão daquele ano e fiz o que qualquer cartunista ou popular faz quando adentram a exposição... Analisar primeiramente os desenhos premiados. Só que, no trajeto que fiz para chegar aos trabalhos vencedores, uma caricatura me chamou a atenção. Era a caricatura do prefeito César Maia, elaborada com tinta acrílica e tão perfeita, que dava a sensação de estar olhando quem passava à sua frente. Mas devido ao fato dàquela caricatura figurar apenas dentre os selecionados para a exposição, imaginei que pudessem haver trabalhos mais surpreendentes. Mas não foi bem assim... Pelo menos para mim.
Que diferença faria a minha opinião? Nenhuma, se eu a tivesse explicitado à comissão julgadora. Mas para mim, mesmo a comissão não atribuindo qualquer premiação, nem mesmo uma menção honrosa para àquela caricatura, àquele trabalho merecia o primeiro lugar na categoria. E e eu queria que seu autor soubesse disso. Queria que o autor soubesse da minha felicidade em ver seu trabalho e que por causa de sua obra, eu me tornara seu fã. Em 1996, àquele cartunista era apenas “mais um” que batalhava e buscava reconhecimento nos salões de humor, através de seus trabalhos. Como muitos que hoje trilham o mesmo caminho, mas que devido à falta de seriedade de algumas comissões julgadoras, perdem o estímulo e acabam desistindo. Logo após a abertura do salão, procurei o contato do cartunista, liguei para ele e falei das minhas impressões. Ele ficou surpreso e a partir de então começamos uma relação de respeito e amizade. Sempre que havia uma oportunidade, nos falávamos. Decidi então, depois de um tempo, ir ao encontro do cartunista e conhecê-lo pesoalmente. Embarquei em um ônibus e depois de passar a noite viajando cheguei à cidade de Campinas. De acordo com as informações que o cartunista havia me dado, eu poderia encontrá-lo em seu estúdio, na Rua Itália, bem perto do terminal rodoviário de Campinas (o antigo). Só precisei andar uns três quarteirões para chegar ao meu destino. Cheguei em uma Clínica de Estética e imaginei ter errado o endereço. Mas mesmo imaginando que pudesse estar equivocado, entrei e fui atendido por uma jovem super educada e de sorriso expansivo, que se apresentou como responsável pelo estabelecimento. Eu me apresentei e disse-lhe que estava a procura do cartunista e o motivo pelo qual eu estava à sua procura. Lembro-me que ela se surpreendeu quando eu falei que eu tinha acabado de desembarcar do Rio de Janeiro, apenas para conversar com o cartunista e que voltaria para casa naquele mesmo dia. Ela então se apresentou como esposa do cartunista e em seguida me convidou para ir ao estúdio dele, que ficava em um quarto anexo ao estabelecimento. O cartunista ficou surpreso ao me ver e parecia não acreditar que seu trabalho poderia promover àquele encontro. Após o primeiro contato pessoal, tanto ele quanto sua esposa, foram extremamente gentis, cordiais e solícitos comigo. Tentaram me fazer desistir de voltar para casa naquele mesmo dia, me oferecendo hospedagem em sua casa. Mas diante da minha decisão em voltar, ambos abdicaram parte do tempo que deveriam estar desenvolvendo suas atividades e ficaram ali, me dando toda a atenção do mundo e tentando demonstrar em pequenos gestos, gratidão por eu estar ali. Enquanto conversávamos, eu manuseva vários originais e observava cada detalhe enquanto o cartunista desenhava. Foram algumas horas que me agregaram informações e que contribuem até hoje para o meu desenvolvimento. Um pouco antes de nos despedirmos, ele me presenteou com dois originais seus: Uma caricatura do Lula, feita com grafite e nanquim (1989) e a minha caricatura, feita com grafite (1996). Hoje, àquele cartunista que em 1996 figurava apenas como “mais um” dentre os expositores nos salões de humor, se tornou um dos maiores cartunistas da nossa geração e eu me orgulho de tê-lo eleito como ídolo e como amigo. Quem é o cartunista? Dálcio.
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