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Estas são 3 páginas do Jornal da ABI (Associação Brasileira de Imprensa), n° 353, com artigo assinado por Paulo Chico. A matéria é referente ao assunto proposto pelo Mestre Zé Graúna em seu blog, escrito em 29/03/2010, (http://zerobertograuna.blogspot.com/2010/03/uma-caricatura-por-uma-gorjeta.html) sobre uma editora carioca que paga R$ 35,00 por uma caricatura.
Quando fui convidado pelo jornalista Paulo Chico para participar desta matéria, me senti bem a vontade para emitir as minhas opiniões, já que fui colaborador da empresa (na década de 1990) e decidi não mais ser, tendo como argumentos a falta de respeito e a desvalorização profissional propostos pela editora.
Lembro-me que em 1998, em uma conversa com o editor, eu disse o quanto me causava desgaste àquela situação. Ele então disse: _ Você é profissional... Precisamos de você. E eu respondi: _ Não tenho o menor interesse em trabalhar com uma empresa que precisa de profissionais e os valoriza como amadores. Em seguida desliguei o telefone e até hoje, penso que foi a minha melhor atitude em relação àquela empresa.
Muitos companheiros de profissão - alguns amigos - ainda prestam serviços para a editora, até os dias de hoje. E cada vez aparecem novos ilustradores e cartunistas, disputando espaço nas capas e paginas das revistas e livros da mesma editora.
Em relação a este assunto, eu não acredito que a dinâmica irá mudar. De qualquer forma, as páginas do Jornal da ABI estão à disposição nesta postagem, com a opinião de outros companheiros e a minha.
Valeu Zé! Valeu Paulo Chico! Parabéns ao Jornal da ABI pela iniciativa em promover o assunto e a reflexão sobre o assunto.
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Abaixo, estou publicando as perguntas que me foram feitas e as minhas respostas sobre o assunto, na íntegra.
* Como resume o mercado atual para ilustradores?
1 ) A visão de mercado que tenho hoje é a de amplitude e desenvolvimento. Existe a questão da "lei da procura" que é infinitamente superior à "lei da oferta". E, muitas das vezes, o mesmo cartunista que publica aqui, independente do quanto ganha, quer ganhar lá e não satisfeito, quer acolá também. E quase sempre são os mesmos, querendo abraçar o mundo com as pernas.
Geralmente, são esses que não se importam o quanto existe o sentido de desvalorização ou não em relação ao seu trabalho. Ele quer ganhar. E se o "ganhar" significa fazer 1000 ilustrações, sendo o valor de R$1,00 por cada imagem, ele fará.
* Já prestou serviços para a Ediouro? A prática citada pelo Graúna, feita pela Ediouro, se repete em outras editoras? O desprestígio dos ilustradores é geral?
2 ) Trabalhei na Ediouro entre 1997 e 1998. Em dia de pagamento e entrega de material, encontrava por lá além dos cartunistas freelas, alguns que tinham seus espaços dentro de jornais conceituados. E sempre que chegava alguém mais novo, argumentava o seguinte: _ Se fulano de tal, que publica em jornal e é conceituado no mercado, se sujeita aos preços pagos pela empresa... Por qual motivo eu não vou aceitar?
Ao meu ver, existe sim o desprestígio tanto por parte de algumas empresas, quanto por parte de alguns companheiros de profissão. Mas também existem empresas que valorizam o trabalho do ilustrador.
* O que levou a tamanha desvalorização das ilustrações em livros, e tb em jornais?
3 ) Vários fatores. Dentre eles, a subserviência de alguns companheiros, que aceitaram as regras impostas por algumas empresas, que avaliam a posição do ilustrador como o step do clip art.
* Como reverter esse quadro e valorizar os artistas?
4 ) Começando pelos próprios artistas. Valorizando-se mais na hora em que receber uma porposta de alguma empresa.
Para alguns, não interessa se eles criam a cultura de desvalorização. Ele ganha pouco em determinada empresa e muito em outra.
* Há quem desenhe por qualquer tostão, sem valorizar a própria produção. Essa aliás, foi uma das críticas feitas pelo Graúna à própria classe. Como vê essa questão? Como deve portar-se o profissional diante de tantas dificuldades e exploração?
5 ) Com certeza! Eu os chamo de "prostitutos do traço". Qualquer "agrado" já garante o serviço.
Vejo como um retrocesso a posição passiva ou de mendicância a qual muitos companheiros se sujeitam e promovem em relação aos demais, por conta de seus interesses.
Como já ouvi dizer: _ É pouco mas já dá para tomar umas cinco geladas!
Como devem se comportar? Da mesma forma que qualquer profissional de outra área se comporta... valorizando-se!
* Quais são suas ocupações hj? Desenha para quem? Por vezes, é difícil sustentar-se como ilustrador? (temos o caso do Trimano, de quem faremos um perfil especial nesta mesma edição do Jornal da ABI)
6 ) Sou responsável (juntamente com o cartunista Ray Costa) pelo Projeto Sorrialengo. Onde atendemos crianças jovens e adultos, utilizando a linguagem da ilustração e do desenho de humor para promover o desenvolvimento dos mesmos junto às suas comunidades. Trata-se de um projeto gratuito, onde sustentamos com àquilo que ganhamos nas premiações de salões de humor e prestações de serviços para empresas.
Ao invés de dedicarmos nosso tempo e conhecimentos técnicos por "gorjetas de empresas milionárias", preferimos promover o conhecimento de graça ( há mais de 10 anos ) para quem realmente precisa.
Prestamos serviços para algumas empresas privadas e pessoas físicas, que nos contratam para que desenvolvamos propostas de ilustrações.
É difícil a sustentação como ilustrador sim. Porque além de algumas empresas que desrespeitam a classe, alguns companheiros de profissão também o fazem, promovendo a concorrência desleal, muitas vezes em troca de qualquer "agrado".
É isso!
6 comentários:
Esse post caiu como uma luva, acabei de recusar uma proposta de fazer ilustração no risco quer dizer ja tinha feito o traço e finalizado e agora me disseram que não foi aprovado, ja fiz umas quatro ilustrações e nenhuma foi aprovada algumas empresas acham que agente é palhaço sem contar o quanto iam me pagar, to com pouco trabalho mas com a consciencia tranquila.
Legal Mattias, é sempre bom tocar nesse assunto.
Como vão valorizar os cartunistas, se os próprios não o fazem?
Valeu, Mattias! Só acho que vc poderia ter incluído as outras duas páginas (as primeiras) que mostram o quanto a tal editora ca#*+ e anda pro seu próprio produto.
Interessante você incluir as perguntas que o Paulo Chico te fez acompanhadas das respostas. Ótima idéia!
Sobre o post do André Blank, a editora citada na matéria costuma fazer exatamente o que o Blank contou.
Abração!
Salve André! Desculpe pela demora tardia. Estou viajando e só pude respoondê-lo agora.
A situação que você abordou é uma prática que, ao que me parece, se tornou comum em muitas editoras. É por isso que muitos companheiros, com trabalhos excepcionais abandonam a profissão e se dedicam a outras atividades. A sugestão que dou é a seguinte, que se faça um contrato onde as partes cumpram àquilo que for acordado. E se uma das partes deixar de cumprir o acordo, pau nela!
Imagine, você gasta tempo, grana, demanda concentração, conhecimento técnico e aí vem um "aspone" e fala: _ Não é bem isso!
Eu preciso de dinheiro também, afinal vivemos em uma sociedade capitalista, mas muitas vezes eu prefiro abrir mão de prestar um serviço para um cliente que não respeite meu trabalho.
Grande abraço e valeu pelo comment!
Salve Dodô!
Tranquilo?
Pois é cara... Infelizmente, muitos companheiros de profissão são os responsáveis pelas penas as quais nos somos subjugados.
E a roda gira... Mal sabem eles, que lá na frente, será ele o penalizado.
Abraço grande!
Salve Zé!
Publicarei também as outras duas páginas até sábado.
Zé, em 1998, antes de eu viajar para a Europa, o bandeira me encomendou 70 cartuns. Eu fiz todos com nanquim e os levei. Chegando lá, ele ficou com o envelope e foi apresentar para outro editor. Por telefone, alguns dias depois, ele me disse que apenas 12 cartuns haviam sido aprovados e que o comentário do outro editor seria que os meus cartuns estavam muito "non sense" e que eu deveria fazer algo que o público não precisasse pensar muito.
Em seguida eu disse que não tinha gostado da atitude e que não havia interesse em trabalhar mais com a Ediouro. Ele retrucou dizendo que profissionais com o meu perfil era bom para a empresa. E aí eu falei que lá eles tratavam profissionais como amadores.
Tenho alguns amigos chegados que ainda prestam serviço para a editora, outros companheiros de profissão que estão lá há mais de 15 anos.
Cada um sabe onde o calo aperta, mas eu não sou obrigado a mendicar nem me prostituir profissionalmente por causa de dinheiro. É a minha opinião e cada um que viva a sua.
Abraço grande e parabéns pela iniciativa. Sempre surpreendente, Mestre.
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